Autobiografia na Música - Pedra - Capítulo 121 - Por Luiz Domingues

E de fato, ele mostrou-nos rapidamente o novo clip, que promoveria a canção "Projeções", ao fazer uma animação simples, mas muito bonita, a utilizar as ilustrações da capa do novo álbum, Pedra II, de autoria de Diogo Oliveira e com sua autorização, logicamente. Estava tudo pronto para lançarmos o segundo clip do novo disco quando.

Empolgados com tudo o que estava a ocorrer, nós jamais poderíamos supor que um mal-entendido gigantesco, provocaria uma ruptura abrupta e triste, a destruir  a nossa euforia. 

Foi assim que tudo arruinou-se: quando Barbieri mostrou-nos o segundo clip, da música "Projeções", nós notamos que ele colocara uma tarja a anunciar o seu site. 

Nada mais justo portanto, que ele inserisse uma propaganda de seu site e foi o mínimo que poderíamos fazer por ele em termos de retribuição por tudo o que ele estava a fazer em nosso favor, ao gerar um verdadeiro portal de oportunidades inimagináveis para a carreira da nossa banda.

Contudo, discordávamos da forma como a tarja aparecia, bem no meio do clip e um tanto quanto exagerada em sua dimensão, a tirar ainda que ligeiramente o foco do clip em si. 

Isso também acontecia com o clip viralizado de "Longe do Chão" e entre nós, achávamos tal procedimento inadequado, mas em meio à euforia gerada pelo resultado no YouTube, nunca tivemos uma conversa franca sobre esse problema e assim, quando ficou pronto o Clip de "Projeções", vimos que ele insistira nesse procedimento e nessa altura, já estávamos prontos para falar abertamente sobre essa reivindicação de nossa parte. 

Todavia, um fato fortuito e quase que involuntário, causou um incidente e mudou o rumo da nossa relação com Barbieri, a estragar a parceria. 

Ocorreu que o Rodrigo colocou uma cópia do clip novo, ainda sem a tal legenda no ar, e quando o Barbieri viu a postagem, enlouqueceu. Da parte do Rodrigo, a sua intenção não fora maquiavélica para prejudicar o Barbieri, é claro que não. Em sua ingenuidade, ele achou que adiantaria o serviço e que "depois", mediante uma conversa, tudo esclarecer-se-ia com Barbieri, visto que na ficha técnica, todo o crédito para ele estava inteiramente correto e com direito à menção ao seu site, o que foi justo e por sinal a atitude mínima de nossa parte para retribuir tudo de bom que ele estava a fazer por nós e certamente ainda faria.

Mas foi o tal negócio... como explicar para o delegado que "nariz de porco não é tomada", como diz-se popularmente? 

Imagino o Barbieri lá em Londres, cheio de entusiasmo para com a banda, a abrir o seu monitor do PC e a ver que o clip fora lançado de forma unilateral e sem a tarja de seu site, sendo que o esforço de produção foi todo seu? O que ele deve ter sentido?  

Claro que ele sentiu-se traído, desprestigiado, humilhado, injustiçado ou seja, no calor da discussão (e foram dias marcados por troca de e-mails tensos travados entre ele e Xando, que absorveu a situação por ter acesso direto aos endereços oficiais da banda e portanto a receber a artilharia pesada de Barbieri na linha de frente), o rompimento das relações foi inevitável. 

Foi um mal-entendido inacreditável que gerou um resultado tão forte, ou maior ainda que o surpreendente sucesso do primeiro clip, eu diria. 

O Rodrigo só desejara lançar o novo clip sem a tarja e nós também achávamos que ela seria inconveniente, esteticamente a falar. Pensávamos que se na edição, o Barbieri colocasse com toda a justiça e direito, a sua propaganda no início e no final do clip, ao estilo da edição da MTV ou VH1, ficaria perfeito para ambas as partes e queríamos tratar disso com ele. 

Portanto, a precipitação inocente do Rodrigo em postar antes de combinar a modificação com o autor dos clips, gerou esse mal-estar de um tamanho gigantesco.

Da parte do Barbieri, ele sentiu-se usado e traído e não foi esse o caso, de forma alguma, pois o Pedra foi formado por quatro homens de bem, que jamais tomariam uma atitude assim contra ninguém, quanto mais um amigo que estava a dar-nos uma mão incrível naquele momento. 

Contudo, no calor da raiva, eu entendo que foi difícil para ele, Barbieri, enxergar a situação com tal frieza e constatar que fora apenas um erro lastimável que cometêramos e sem nenhuma intenção de prejudicar o nosso benfeitor, o que aliás seria uma maluquice sem sentido algum de nossa parte.  

Como resultado prático, após discussões ríspidas das duas partes, Barbieri retirou o clip de "Longe do Chão" do ar e cancelou o lançamento do clip de "Projeções". 

Meu caro leitor, diante de tudo o que já falei sobre o episódio desses clips, em especial o do "robot", dá para mensurar o tamanho do prejuízo artístico que essa decisão de retirá-lo do ar, causou-nos? 

Então, ao cessar a animosidade, mas com o selo amargo do rompimento de relações, Barbieri pediu a nossa atitude em forma de cavalheirismo, para que também retirássemos o vídeo de "Longe do Chão" do ar, ao pensar em nossas postagens, e claro que o fizemos, em termos de lisura. 

E a minha situação pessoal nesse imbróglio, como ficou?

Sim, por que dos quatro, eu fui o que melhor conhecia o Barbieri, por conta dos inúmeros show que ele produziu da minha banda nos anos oitenta, A Chave do Sol, e neste caso, a minha impressão sempre fora a melhor possível sobre sua pessoa, em todos os quesitos, notadamente a se destacar a sua força como produtor entusiasmado e empreendedor, assim como a lisura no trato financeiro. 

Pelo lado humano, eu sempre o considerei como um bom amigo. Entretanto, ali em 2008, eu vivi um pequeno dilema pessoal, pois não acessava a internet, e por não saber nem o be-a-bá dos computadores, que possibilitasse-me dirigir-me à uma Lan House do bairro e comunicar-me com ele, quando certamente o chamaria para uma conversa esclarecedora entre amigos e sei que ele ouvir-me-ia com outros ouvidos.

Por outro lado, eu não poderia também ser contra o pensamento da minha banda e de seus interesses, além de que particularmente, também achava que a história da tarja estava exagerada e deveria ser modificada.

Então, ao avançar um pouco na cronologia, mas só para encerrar esse episódio da relação entre Pedra & Barbieri, digo que por ocasião do Natal de 2008, eu providenciei o endereço postal dele em Londres e enviei-lhe uma carta manuscrita, tradicional, a ponderar sobre tudo isso e a expressar o meu lamento pelo mal-entendido que gerou prejuízo e perda para todos e também a afirmar que eu estava chateado em nome da nossa amizade que vinha desde os anos oitenta. 

Eu precisava tomar essa atitude, por tudo o que já expressei antes, mas sobretudo pelo fator limitante de não ter comunicação virtual e ter passado a imagem de conivente ou omisso nessa situação. 

Alguns dias depois, a avançar por janeiro de 2009, eis que eu recebi uma carta muito bonita, manuscrita por ele, a mostrar-se emocionado com a minha manifestação e a reiterar que apesar do aborrecimento gerado, ele tinha certeza de que isso não abalaria a nossa amizade forjada há décadas e que ficara muito emocionado com a minha manifestação isolada e sincera.

Não demonstrou no entanto, nessa carta, que havia entendido e absorvido o ponto de vista do Pedra nessa confusão, mas foi o tal negócio, eu não poderia exigir que ele entendesse, pois se tratou de uma questão de fórum íntimo da parte dele. 

O tempo passou, o Pedra acabou, passou mais um tempo e o Pedra voltou (não preocupe-se, leitor, pois volto à cronologia assim que terminar este raciocínio). 

Então, em 2013, passados cinco anos desse lamentável episódio, sem alarde, sem propaganda, Barbieri repostou os dois clips do Pedra no YouTube.

Claro que a repercussão foi muitíssimo diferente, haja vista que hoje, 2016, o clip de "Longe do Chão" ainda está com "setecentas e poucas visualizações", em um padrão até abaixo do que o Pedra gerou com os seus promos mais simples, normalmente ao longo de sua história. 

Mas eu fiquei contente por ele ter tido tal atitude e também por desta vez colocar os seus créditos de uma forma bem mais razoável, ao fazer a sua justa propaganda, mas sem tirar o foco dos dois clips em si. Mais que isso, ambas a produções, o clip de "Projeções", também, são belas obras que ele fez e merecem muito estar no ar para que as pessoas usufruam dessas belas peças audiovisuais.

O Clip de "Projeções", criado em 2008, mas só lançado oficialmente em 2013. Produzido por Antonio Celso Barbieri, baseado nas ilustrações de Diogo Oliveira  

Eis o Link para assistir no YouTube:
https://www.youtube.com/watch?v=wL9NQ59CikY

As músicas e as imagens em ambos, casam-se de forma extraordinária e eu atribuo ao Barbieri a feliz percepção de ter feito tal junção, fora o trabalho todo da produção e o seu costumeiro entusiasmo em produzir, agitar, empreender!

Por volta de 2014, ele abordou-nos timidamente, como se a relação estivesse a normalizar-se, a aventar a possibilidade de participarmos de um festival com artistas brasileiros em Londres. 

E nessa altura, eu já interagia fartamente na Internet e participei das conversas. Não deu certo, fatores assim são complicados e tudo bem, a vida seguiu. 

A nossa amizade pessoal continua normal, falamo-nos por telefone quando ele veio ao Brasil em 2015 e infelizmente eu estava a convalescer por ter enfrentado duas cirurgias decorrentes de um problema de saúde que tive no início desse ano, e por isso não encontramo-nos pessoalmente. Vez por outra ele publica textos meus que aprecia em seu site, e isso deixa-me feliz e honrado, certamente. 

Foi assim então a história dos clips produzidos por Antonio Celso Barbieri e apesar do desfecho lastimável que tivemos em 2008, a vida seguiu para o Pedra, apesar da perda incalculável que isso gerou na época. 

Ficamos chateados ao extremo pelo ocorrido, mas tínhamos shows para fazer.

Continua...