O leitor mais atento há de recordar-se que ali fizéramos o nosso primeiro show, exatamente dois antes antes, portanto, haveria de ser simbólico para nós uma nova participação com tantos fatos ocorridos nesse ínterim e apesar das dificuldades inerentes a uma banda independente a habitar o underground da música, havíamos crescido em vários aspectos.
Nessa feira, o "Palco Rock" é tradicionalmente o mais concorrido, com certa dificuldade para agendar-se uma participação, tamanha a demanda de postulantes, incluso bandas de outras cidades e estados que sabem que a Feira da Pompeia é uma vitrine para as suas aspirações.
Mas
nós tentamos uma cartada nova como estratégia e quando negociamos a nossa
participação, pedimos para tocar em um outro palco, destinado à atrações fora do espectro do Rock, a transitar entre a MPB moderna e outras vertentes, tais como a
World Music, música étnica e até artistas com tendências experimentais.
Não que
estivéssemos a negar as nossas raízes, como uma assumida banda de Rock, mas
queríamos ter a chance de tocar para um público diferente, no afã de
conquistar novas frentes e além disso, a concorrência foi bem menor em
um palco assim, pois estávamos acostumados a lidarmos com a dificuldade de se agendar espaço no Palco Rock.
O lado obscuro dessa estratégia, seria o resultado prático, pois apesar da habitual bagunça que o "Palco Rock" tem na sua produção e logística, é de fato o que mais atrai público.
Dessa maneira, sabíamos de antemão que não teríamos um público com milhares de pessoas como acontece todo ano no "Palco Rock", mas apostávamos na presença de um público diferente e que talvez começasse a descobrir-nos como artistas além de que, seguramente, teríamos mais espaço para tocar, visto que a logística do "Palco Rock" é sempre tumultuada e quando o artista sobe ao palco, inexoravelmente é muito maltratado por produtores do festival que estão sob um estado de "pilha de nervos" pelos atrasos inevitáveis, e assim, eles costumam descontar nos artistas, toda a pressão pela bagunça da qual eles são os únicos responsáveis.
Fora isso, o tempo para tocar, geralmente programado para ser em torno de meia hora para cada artista, acaba por se reduzir drasticamente com os atrasos e a relembrar, quando tocamos em 2006, esperamos horas para tocar e quando subimos ao palco, tocamos a primeira música e ao iniciarmos a segunda canção, já estávamos a ser violentamente pressionados para encerrarmos a nossa apresentação.
Portanto, isso também pesou para a nossa decisão de procurar espaço em outro palco, talvez menos concorrido e portanto presumivelmente mais confortável em termos de tempo.
Tal palco chamava-se: "Palco Atitudes".
Acho que
eu já exprimi a minha opinião para a conotação errônea que a palavra
"atitude" assumiu no universo do Rock pós-anos oitenta, e a autêntica contrariedade que eu nutro por tal expressão forjada por marqueteiros e
jornalistas mal-intencionados.
Sob um erro na interpretação do release oficial do evento, neste site, anunciaram-nos como se fôssemos tocar no Palco Rock.
Portanto, já causava-me uma impressão ruim tal nome a denotar uma intenção obscura, para ser ameno. Mas tudo bem, apesar disso, eu estava motivado para tocar e como os demais, estava também a apostar na eficácia da nossa estratégia.
Entretanto tudo foi por água abaixo, quando fomos notificados que havíamos sido escalados para tocar às 12:30 horas, ou seja, um horário ingrato pelo fator do calor e fatal baixa frequência, pois mesmo com a Feira já a apresentar um bom público que circula pelas ruas nesse horário, fatalmente não seria o público consumidor de música e sim o contingente mais interessado em visitar as centenas de barracas de comidas & bebidas e artesanato ali disponíveis.
E não deu outra, quando chegamos ao palco montado na esquina das ruas Ministro Ferreira Alves e Tucuna, havia um público muito pequeno para assistir o artista que apresentava-se antes de nós.
Sinceramente não lembro-me o nome da banda em questão. Apenas recordo-me que era um quarteto, igualmente como nós, mas nitidamente os músicos não tinham uma escola Rocker como a nossa, pela pegada.
Ele produziam ali um som Pop, meio anos oitenta/meio MPB "moderninha" ao sabor dos artistas da gravadora "Trama", para
definir de uma forma generalizada.
Quando
acabou a sua apresentação, eu percebi que a produção desse palco se portava de uma forma nitidamente mais
amistosa do que a grosseria típica perpetrada pelos sujeitos que trabalhavam no "Palco
Rock" e isso reconfortou-me pela escolha que fizéramos.
Fomos chamados a apresentarmo-nos e o nosso show foi bem leve, no bom sentido do termo, com o som bem equalizado nos monitores. O lado mau, foi que o público não melhorou grande coisa quando começamos.
Para ser sincero, ao comparar com a multidão do "Palco Rock", eu diria que foi irrisório, com pouco mais de cinquenta pessoas na frente do palco, o que foi muito decepcionante para nós.
Para
contrariar o que eu falei alguns parágrafos acima, digo que tocamos "quase"
confortavelmente em termos de tempo, pois uma produtora começou uma leve
pressão na penúltima música prevista de nosso set list, a querer cortar
o nosso tempo, ao alegar atraso.
Foi ameno, é verdade, mas depois que saímos, subiu ao palco uma banda que na minha ótica agiu errado duplamente. Primeiro, que os sujeitos tocaram uma ou duas músicas autorais e as demais, covers, e pior ainda, covers de artistas de qualidade muito duvidosa no cenário do mainstream daquela época.
E segundo, por que o seu set teve uma duração a contabilizar quase o dobro do nosso e ninguém da produção importunou-os para que encurtassem o seu show e deixassem o palco. O Xando ficou chateado, lembro-me bem, e na primeira oportunidade que a mocinha que incomodara-nos passou por nós, ele a cobrou, a lhe falar que a banda em questão estava a tocar o dobro do tempo e ainda por cima não teve cabimento que esses músicos estivessem a praticar covers em um espaço que fora designado para a prática da música autoral.
A mocinha ficou naquele discurso padronizado ao estilo "call center", a emitir desculpas esfarrapadas e só faltou dizer-lhe: -"estaremos analisando a sua queixa, senhor"...
A se resumir, fizemos uma tentativa e não logramos êxito no nosso intento. Tocamos em um palco desinteressante, sob um horário inóspito e para um público sofrível em termos de contingente. Não havia nenhum artista significativo do meio artístico para dar élan à nossa escalação no mesmo dia a estar escalado para tocar no mesmo palco e o razoável conforto que supostamente tivemos por não enfrentarmos a truculência típica perpetrada pelos sujeitos do "Palco Rock", não valeu a pena.
Como consolo, foi possível almoçar tranquilamente e ir para casa assistir a rodada do futebol pela TV.
Uma última nota curiosa sobre esse dia, não tem nada a ver com a banda em si. A aproveitar a Feira em curso, Ivan foi dar uma volta com a família, visto que havia trazido a esposa e o seu casal de filhos.
O seu caçula, Lucas, não tinha nem dois anos de idade ainda e naquela semana, ele havia levado um tombo caseiro e estava com o seu rosto a ostentar um pequeno hematoma. Contudo, nesse dia o menino estava alegre, certamente excitado pela agitação da Feira e por ter visto o pai tocar, nem lembrava-se do machucado.
Bem nessa época, um caso policial que repercutia nacionalmente, dava conta de um pai e sua esposa, a madrasta de uma menina de seis anos, que foram acusados de assassinar a criança, ao tê-la jogado pela janela de um apartamento bem alto.
Pois o que é a junção entre a estupidez humana e o poder da mídia! O passeio da família foi encurtado por que Ivan e a sua esposa, Beth, foram hostilizados verbalmente por alguns populares, que julgaram ser o hematoma no rosto do menino, uma agressão de seus pais. Em suma: "Santa Ignorância, Batman"...
Agora, de nossa parte, restara-nos focar no lançamento do novo disco e nos prepararmos para mais shows, somente marcados para julho.
Continua...
Nenhum comentário:
Postar um comentário