terça-feira, 8 de setembro de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 132 - Por Luiz Domingues

A casa em que tocaríamos, em questão, eu e o Junior já a conhecíamos, pois havíamos viajado ao interior várias vezes para fechar shows em diversas cidades daquela região, e de outras, também. Não se tratava de um ambiente Rocker, mas uma casa noturna criada para atender a jovem burguesia da cidade de Americana, e certamente de cidades vizinhas muito próximas, caso de Santa Bárbara D'Oeste, cuja fronteira com Americana nem se percebe, pois as cidades estão interligadas, literalmente. Até aí, tudo bem. Não seria a primeira, tampouco a última vez em que nos apresentaríamos em uma casa sem uma ambientação Rocker adequada, infelizmente. Ossos do ofício, nem sempre as condições artísticas e/ou técnicas foram as ideais...

No caso desse estabelecimento, como uma compensação, o equipamento disponibilizado, era muito bom. Havia um PA com bastante pressão sonora, aliás, era até demais para o tamanho da casa, portanto o técnico tinha que dosar bem o volume geral, pois a tendência foi a de ensurdecer, se não tomasse cuidado. A iluminação também era muito digna, até surpreendente ao considerar se tratar de uma casa noturna, sem preocupações culturais maiores, a não ser o mero entretenimento de seus clientes. 

O equipamento pertencia a uma banda de bailes da região (não me recordo ao certo, mas acho que fora de Araras-SP, uma cidade vizinha), e o técnico/dono era o baterista da banda. Veterano, esse músico era egresso da época da Jovem Guarda sessentista e assim, nós passamos bons momentos a ouvir as suas histórias a nos contar como a sua banda acompanhou cantores desse movimento, em shows pelo interior de São Paulo etc. e tal. Rimos bastante de algumas histórias que ele nos contou, principalmente de algumas trapalhadas a envolver certos cantores da Jovem Guarda.

Esse foi o lado bom da casa, e diga-se de passagem, foi bastante surpreendente poder contar com um palco com extensão bem confortável, e um equipamento de som e iluminação muito digno, além da camaradagem do técnico e de seu filho, auxiliar de produção, e também um rapaz simpático e solícito.

O lado ruim, foi o fato de não ser um ambiente Rocker, sob vários aspectos. O primeiro quesito (ou esquisito, eu posso afirmar), foi o fato do público habitue da casa, não dar a mínima atenção para qualquer banda que ali se apresentava. Acostumado a tratar as bandas como um mero "jukebox", adotavam o comportamento blasé nesse sentido. Para uma banda cover, caso de 99% das bandas que ali se apresentavam regularmente, isso não seria um problema, pelo contrário, lhe facilitava o trabalho, mas para uma banda autoral, e no caso da Patrulha do Espaço, com uma história muito  significativa sobre os ombros, seria no mínimo, desagradável...

Quando eu e Junior fomos visitar a casa, cerca de três meses antes, notamos isso claramente. Uma banda tocava naquela noite e ninguém, absolutamente ninguém, olhava para ela que se apresentava. Pelo contrário, a maioria se colocava de costas para ela, a preferir ater-se à movimentação da paquera, que fora a real intenção de meninos e meninas que ali se encontravam. Até aí, tudo bem, foi compreensível que essa garotada não estivesse com a mínima intenção de absorver música e muito menos assistir o show de uma banda autoral. Não cabe crítica de minha parte, mas apenas constato que essa exposição, ou melhor, "falta de", não haveria de ser agradável para nós.

Enfim, esse show foi estratégico para o início dessa micro-turnê, e a quarta-feira fora o único dia da semana onde os donos da casa disponibilizavam para uma banda autoral se apresentar. E mesmo assim, houvera a ressalva de que deveríamos inserir alguns covers no meio da apresentação. Nesse sentido, acrescentamos algumas canções que costumávamos tocar em ensaios como mera recreação entre nós e assim, uma versão de "While my Guitar Gently Weeps", dos Beatles a homenagear o George Harrison, que havia falecido há poucos dias.

Um outro aspecto desagradável dessa casa, dava-se com a sua decoração. Tudo ali dentro remetia à ambientação de um motel, com insinuações de erotismo, luxúria etc. Estátuas de personagens mitológicos greco/romanos com intenções eróticas, eram de um mau gosto atroz. Do carpete à decoração das paredes, a passar pelas luminárias, tudo parecia um motel decadente. Como set de uma pornochanchada setentista, seria perfeito, mas como casa noturna, se mostrava como um exemplo de mau gosto Kitsch. 

Às quartas, o ingresso das mulheres até a meia-noite, era  inteiramente gratuito. Por isso, por volta das 23:00 horas, a fila na rua, costumeiramente dobrava a esquina e só com garotas que pareciam estar produzidas para participar de um concurso de Miss.

Claro que isso amenizava e muito o clima brega da casa, com a beleza das meninas a ofuscar aquele horror kistch, mas claro, também que não teríamos a atenção delas, muito mais interessadas em se exibir para os rapazes e estabelecer a competitividade entre elas mesmas, naquela típica tendência feminina..."espelho, espelho meu, quem é mais bonita do que eu?" E assim, resignados fomos para o palco...

Todas as fotos que copiei da Internet para ilustrar este capítulo, são do My Way, de Americana, de fato, com exceção da foto das estátuas, que é meramente ilustrativa.  

Continua...

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