Decidimos nos dirigir ao Sesc Itaquera com o nosso ônibus, pois afinal de contas seria um show de porte e neste caso, haveria de ser um gesto mínimo de profissionalismo de nossa parte levarmos o nosso backline próprio, ainda que houvesse um bom equipamento disponível no palco, da parte da produção do evento.
A nossa participação fora mesmo um encaixe, pois o evento se revelou como um daqueles típicos shows promovidos por uma estação de rádio, onde o artista costumava tocar de graça, como a prover um "investimento de carreira", em troca de execuções radiofônicas de seu trabalho. Muitos artistas submetiam-se a esse tipo de permuta, que na prática era uma espécie de "jabá branco"...
Enfim, chegamos à tal unidade do Sesc, no início da tarde, pois o soundcheck seria realizado muito cedo, de uma forma bem rápida e em cima da hora do show. O nosso ônibus ainda não havia recebido a sua nova cor, portanto, voltou à oficina depois desse compromisso, para o arremate final.
Logo que estacionamos o nosso valente Mercedes1976, vimos que a diferença entre estar ou não no mainstream se refletia desde o estacionamento. As duas bandas que foram as estrelas do show, ostentavam ônibus de última linha, modernos e a tinir para o seu transporte, enquanto o nosso parecia um velho exemplar saído de algum museu da categoria.
Uma equipe de "carriers" do Sesc veio nos auxiliar na árdua tarefa do descarregamento e foi providencial, por que só tínhamos dois roadies nossos para essa apresentação. E ali já ocorreu um fato hilário! Um dos carriers do Sesc, era um sujeito nanico, ainda muito mais baixo do que eu (eu meço: 1.65 m). Na hora em que o vimos, nos entreolhamos estupefatos, pois apesar dele ser troncudo e com braços musculosos, a sua baixa estatura nos deixava incrédulos sob o bom exercício da sua profissão, por motivos óbvios. O que é o preconceito, veha só, pois o rapaz detinha uma força descomunal e uma agilidade inacreditável. O seu primeiro ato dentro do ônibus, foi colocar o amplificador do Rodrigo no ombro e daí, saiu a correr de uma forma desenfreada, literalmente, dali até o palco, como se estivesse a transportar um volume simples e sem peso algum.
Ficamos boquiabertos ao vermos o sujeito fazer essa tarefa hercúlea com tal agilidade e o festival de piadas começou ali mesmo. Eu mesmo me antecipei e apelidei o sujeito como: "Cacique Cobra Coral", por que ele tinha a pele avermelhada e ostentava uma cabeleira parecida com o corte que indígenas costumam usar, no estilo: "tijelinha".
E para quem acompanha a política, deve recordar-se que o "Cacique Cobra Coral" é supostamente um espírito que se manifesta para um médium e dá conselhos para políticos. Pois bem nessa época, a sua figura estava popular na mídia, pois presumivelmente estaria a alertar o governo federal sobre o colapso energético iminente,
mas pelo visto, os tucanos que comandavam a floresta nessa época, não lhe deram ouvidos...
Enfim, quando pensávamos que o pequeno, Cacique Cobra Coral, o carrier, e não o espírito, teria um colapso cardíaco no palco, ei-lo de volta no ônibus e com a mesma desenvoltura, colocou a carcaça pesada do piano Fender Rhodes do Marcello nos ombros, e saiu em disparada novamente...
Primeira lição da tarde: não prejulgue um homem pela sua baixa estatura!
Continua...
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