quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 115 - Por Luiz Domingues

O sujeito era bastante arrogante e usava da aspereza como uma arma para impor a sua estratégia de intimidação. Estávamos diante de um impasse, pois pagar o "pedagio" que ele exigia, seria uma indecência e também um fator de baixo astral abominável naquele momento, e a preceder poucos minutos antes de subirmos ao palco.

Claro que o produtor de palco do Sesc também indignou-se, e o clima esquentou. Ao constatar que o impasse estava incontornável com a postura intransigente do rapaz, o responsável do Sesc nos disse para irmos para o camarim "relaxar" e fazer um lanche. Teve a sensibilidade óbvia de nos poupar (nesse caso, minimizar, pois o estrago já estava feito), de um aborrecimento absolutamente desnecessário e muito inoportuno naquele momento, pois paz de espírito no camarim, nos minutos que precedem o show, é uma necessidade básica para qualquer artista.
Disse-nos também para ficarmos tranquilos, pois o show transcorreria com tranquilidade e que aquela ameaça seria contornada. O cachê extra que o sujeito exigiu de nós, foi de um valor alto para os padrões daquela época. Equivalia a um cachê muito maior do que de um técnico de padrão mainstream, ou seja, o sujeito quis aproveitar-se da nossa situação insípida naquela tarde, para arrancar um valor duplo, pois ganharia o mesmo montante a operar as duas bandas programadas.

O produtor do Sesc ficou bastante irritado com o oportunismo e sobretudo pelo comportamento pouco recomendável do rapaz, mas apesar de ter alterado um pouco o volume de sua voz em algum momento mais tenso da conversa, contemporizou com classe, eu diria.
O que eles conversaram e acertaram após a nossa debandada para o camarim, não sei o que foi exatamente. Duvido que ele tivesse aceitado a reivindicação monetária que o sujeito pleiteou, mas o fato foi que fomos avisados no camarim que tudo se resolvera, e que nos tranquilizássemos, pois não teríamos problemas técnicos derivados de boicotes e/ou sabotagens da parte desse rapaz.

No camarim, claro que não conseguimos relaxar totalmente depois de um clima desses. Mas o fato de não sermos uma banda acostumada às benesses da estrutura mainstream, até que nos proporcionara certas vantagens, no sentido de que tão habituados a lidar com adversidades, o fato do som não estar maravilhoso no palco, não nos derrubaria facilmente. De tanto tocar sob condições técnicas adversas, o músico que se acostuma ao esquema underground, culmina em desenvolver uma espécie de "casca grossa" e para derrubá-lo no palco, um monitor mal-equalizado não basta.
Portanto, estávamos indignados pela questão moral, mas tecnicamente, o fato do rapaz não se empenhar para nos proporcionar as melhores condições sonoras, não faria diferença para nós. Só não queríamos a sabotagem explícita.

Um momento lúdico aconteceu quando descobrimos que um dos ônibus que transportava as bandas mainstream, continha placa da cidade de "Santo Antonio da Patrulha". Tratava-se de uma pequena cidade interiorana no Rio Grande do Sul.

Ainda no camarim, enquanto lanchávamos, o pessoal do Biquini Cavadão também desfrutava do mesmo espaço e lanche. O vocalista dessa banda, Bruno Gouveia, foi bastante respeitoso e veio nos cumprimentar, ao fazer questão de falar mais detidamente com o Rolando Castello Junior, quando apresentou os seus respeitos ao membro fundador da nossa banda e contemporâneo do Arnaldo Baptista, ao demonstrar um grau de conhecimento e respeito que eu apreciei.

Quanto à outra banda, o tal Tihuana, os seus membros somente apareceram no Sesc, bem mais tarde. Quem passou o seu som foram os seus roadies, um bando de sujeitos mal-encarados, arrogantes e prepotentes.
O som dessa banda estava em voga desde os anos noventa, como uma mistura agressiva de Punk-Rock, Hip Hop e Metal extremo, ou seja, chegava a ser um disparate tocarmos juntos pela obviedade do antagonismo estético entre nós. Talvez em um mundo devastado e pós-apocalíptico ao estilo de ambientações de filmes como Blade Runner e Mad Max, esses sujeitos possam ser considerados "Rockers" em tal realidade bizarra, mas certamente eu não compactuo com tal determinação.

Enfim, tocar junto com o Biquini Cavadão foi até aceitável, mesmo não havendo nenhuma proximidade entre os respectivos trabalhos, mas a segunda banda em questão, foi um disparate. Tanto foi assim, que quando fomos chamados ao palco, uma recepção inamistosa nos surpreendeu, segundos antes de darmos o primeiro acorde da primeira música...

Continua...

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