quarta-feira, 8 de julho de 2015

Autobiografia na Música - Pitbulls on Crack - Capítulo 103 - Por Luiz Domingues

 
Apesar do clima galhofeiro e crônico nesse sentido, sempre muito forte nos bastidores do Pitbulls on Crack, e da identidade sessentista ser praticamente uma farsa como ideologia da banda, propriamente dita, claro que todo mundo apreciava muitos ícones contraculturais e em certos aspectos, houve uma harmonia nesse sentido. Claro, com graus de comprometimento e entusiasmo, diferenciados. Eu estava enlouquecido pela questão do resgate, e vivia como se estivesse em 1967, O Chris e o Deca gostavam muito dessa vibração, apesar das piadas e o Juan Pastor, bem menos, mas também apreciava alguns aspectos.

Por exemplo, a questão de tentarmos imprimir uma atmosfera sessentista no nosso camarim, para a ambientação, e assim, absorvermos uma vibração muito auspiciosa para subir ao palco, e termos um recanto de pós-show, claro. Já estávamos a criar esse ambiente em shows recentes, mas nesse em específico, onde sabíamos que ficaríamos horas no camarim, demos uma caprichada maior e ficou bem agradável.

O Deca caprichou nessa produção, a trazer tecidos indianos de sua casa para decorar o ambiente dessa forma, e assim montamos uma verdadeira "tenda hippie". Com muitas flores, incensos e retratos de Deuses hindus e ícones do Rock etc. E também, providenciou um som para servir como lounge, somente com a cítara de Ravi Shankar a estabelecer uma atmosfera incrivelmente relaxante e inspiradora. O nosso camarim tornou-se atração do festival entre os assessores de produção do evento. Veio gente até para fotografar...
 

Fato muito interessante, foi que recebemos diversos representantes de fanzines a pleitear entrevistas. Em sua maioria, eram jovenzinhos representantes de fanzines focados no universo do Punk-Rock e enxergavam o Pitbulls on Crack, como uma banda Punk, sem perceber nada ao nosso redor.

Mesmo com toda a maquiagem sonora e no aparato todo, a questão semiótica é sempre complexa. Uma coisa foi acharmos que estávamos a passar uma mensagem clara e outra, bem diferente, foi a maneira pela qual as pessoas interpretaram tal mensagem. Bem, confesso que também aprendi muitas lições nesses anos com o Pitbulls on Crack e com esse convívio com pessoas que transitavam entre o Punk, Pós-Punk, e os seus derivados todos, incluso o estilo "indie", eis que eu aprendi a ser muito mais tolerante e compreensivo nesse aspecto.

Nessa altura, eu já tinha a plena consciência de que nem todo mundo que gostava do Punk-Rock em si, comungava com aqueles conceitos agressivos lançados em meio ao manifesto de 1977. 

Garotos a produzir esses fanzines, por exemplo, nem suspeitavam que tal movimento em seu nascedouro, fora carregado de preconceitos, revanchismos infundados, perseguições e preconceitos sem cabimento. Então, como eu poderia nutrir algo contra esses meninos?

Um outro aspecto interessante sobre a montagem de nosso camarim hippie, foi que muitos (muitos mesmo, não estou a exagerar), vieram comentar conosco que a notícia de nosso camarim estar todo arrumado daquele jeito, e nós sermos receptivos, destoara do camarim de uma certa outra banda participante do festival, onde estes mesmos interlocutores haviam sido tratados com rispidez. 


Bah... como dizia a Gal Costa, naquela velha (e ótima) canção: "Cultura e civilização, elas que se danem"...


Continua...

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