As músicas estavam a ser executadas em meio a uma performance incrível,
pelo fato da sinergia com o público estar totalmente estabelecida, mas
houve um elemento além, que foi o fato de que não parar (ao considerar-se que ainda faltavam algumas músicas a despeito do nosso desconforto pelo calor, estar quase desumano), foi um fator de
superação atlética, eu diria, pois o calor estava infernal e a impressão
que tínhamos, foi que o melhor antídoto para enfrentá-lo, seria mesmo
não estabelecer pausas demasiadas entra as músicas.
Entretanto, um colapso estava por vir, e nos deu um susto tremendo...
Quase
ao final do nosso set list, uma pequena pane ocorreu no amplificador que
eu estava a usar. Se tratou de um cabeçote da marca Hiwatt, cujo dono era amigo dos
membros do Azul Limão, e que o cedera amigavelmente para o evento. Não
foi nada demais a avaria, apenas a queima de um fusível, talvez pelo desgaste que
o calor estava a impactar sobre todo o equipamento, também.
Aliás,
foi a primeira vez em que usei um cabeçote Hiwatt ao vivo, que ao lado do Acoustic
360; Marshall; Fender Bass Man e Orange, estava na lista dos
amplificadores que eu sonhava possuir desde os anos setenta, quando via os meus
ídolos através de fotos e vídeos, a usar tais marcas.
No caso do
Hiwatt, a lembrança do John Entwistle, foi automática para mim, e
portanto, apreciei muito cumprir um show com um amplificador desse quilate. A
caixa que o sustentava não era Hiwatt, infelizmente. Claro que se o
fosse, eu teria tirado um timbre monstruoso a la Entwistle, nos seus
melhores momentos de The Who, mas mesmo com uma caixa simplória,
feita em casa, e com falante nacional (acho que era Arlen, se não me engano),
tirei um som incrível, com peso e timbre de arrepiar.
Enfim,
ao voltar ao caso do "susto", o fato é que essa parada para a troca de fusível no
amplificador, estabeleceu uma quebra no ritmo frenético em que estávamos e
ao parar forçosamente, aí sentimos o calor verdadeiramente infernal!
E nos desesperamos quando vimos o Zé Luiz a desmaiar e cair sobre o surdo da bateria!
Ele
estava a enxugar-se naquele momento de pausa, mas por não ter suportado a
queda brusca de sua pressão sanguínea, desmaiou, ao perder os sentidos por
alguns segundos.
Em meio à balbúrdia instaurada no palco naquele
instante, com roadies a arrumar o amplificador que eu estava a usar,
nem todo mundo percebeu tal cena. Lembro-me do Rubens e do Beto a voar para socorrê-lo, mas tirante poucas pessoas do público que perceberam o
fato, a maioria do público gritava e saudava-nos, por que estavam
a apreciar muito o show, e estavam com a atenção voltada apenas à pane que o
amplificador de baixo havia tido.
Foram poucos segundos, pois
logo ele voltou à consciência e resoluto, não quis nem saber de nossos
apelos para retirar-se ao camarim, e procurar o atendimento médico. |Ao contrário, ele quis
voltar imediatamente, para dar prosseguimento ao show, e ao afirmar estar bem.
Ora,
o correto teria sido encerrar o show e ir ao pronto-socorro de um
hospital para um exame, imediatamente, mas com a fibra que o Zé Luiz
tinha (tem), isso foi descartado de pronto por ele, ao insistir em
prosseguir. Convenhamos, naquelas condições climáticas, por tocar
bateria em uma banda de Rock, sob o impacto de spots de luz a ferver, foi uma
temeridade prosseguir após um desmaio. Mas o Zé Luiz foi até o fim...
Terminamos
o show sob uma ovação incrível. O público vibrou muito e aquilo comoveu-nos, até, pois sabíamos que tínhamos um público grande no Rio, por
tudo o que eu já comentei anteriormente, contudo, aquela reação fora muito além
do que as nossas previsões mais otimistas poderiam supor.
No
camarim, o Zé Luiz mostrou-se bem. Estava cansado e incomodado pelo calor,
como todos nós, mas nem pareceu ter tido um colapso de queda de pressão
sanguínea, poucos minutos antes.
Um amigo carioca, mostrou-me um
termômetro que tinha em mãos, a deixar-me atônito: 52 graus
celsius registrados naquele palco! Uma condição climática típica do deserto
do Saara.
Não foi à toa que o Zé Luiz tenha passado mal.
A minha
camisa rasgou, a desmantelar-se como se tivesse caído em um balde de
ácido sulfúrico... e devo registrar que era uma camisa de seda, bonita, com um tecido fino e
que eu encomendara para uma costureira em 1984, a custar caro... enfim,
ossos do ofício, tudo pela arte; tudo pelo Rock! O saldo desse
show foi maravilhoso para nós, com um público quentíssimo,
surpreendente, até.
Nos hospedamos no apartamento da irmã mais velha do
Zé Luiz, que morava no Rio, a Eliana Dinola. Muito gentil e nossa "torcedora" desde sempre, cedeu o seu
apartamento para ser o nosso QG naquela ocasião. Comemoramos o ótimo show
que fizéramos, com um jantar no Sagres da Gávea, restaurante frequentado
por artistas de teatro, jornalistas e músicos, e que eu conhecia desde
1984, quando fui ao Rio de Janeiro fazer temporada com o Língua de Trapo.
A
Eliana Dinola seria uma aliada nossa em outras ações importantes no Rio,
que eu contarei em um outro momento. Ela era mais velha que o Zé Luiz, alguns
anos, e dava para sentir que estava empolgada com o sucesso emergente
que o seu irmão caçula estava a fazer, e nesse embalo, ofereceu-se
para ajudar na produção, em frentes cariocas.
Claro que aceitamos, mesmo
por que, apesar de não ser uma pessoa do ramo do show business, ela era
bastante inteligente e bem articulada, fora ser uma mulher linda e muito
charmosa, ou seja, era o tipo de produtora que não teria dificuldades
para entrar nos lugares chave, e conversar com "tycons" da música
mainstream...
Uma matéria sobre esse show, foi publicada posteriormente na revista "Metal", que mais para frente nesta narrativa, reproduzirei o seu teor.
Foi
assim o nosso show no espaço "Caverna II", no Rio de Janeiro, no dia 25
de maio de 1986, com mil e trezentas pessoas presentes, a produzir um forte calor humano, em todos
os sentidos.
O nosso próximo compromisso de show seria em São
Paulo, no entanto, em uma casa noturna de pequeno porte, e sob circunstâncias bem
menos quentes, em todos os sentidos...
Continua...
Neste meu segundo Blog, convido amigos para escrever; publico material alternativo de minha autoria, e não publicado em meu Blog 1, além de estar a publicar sob um formato em micro capítulos, o texto de minha autobiografia na música, inclusive com atualizações que não constam no livro oficial. E também anuncio as minhas atividades musicais mais recentes.
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