sexta-feira, 22 de maio de 2015

Autobiografia na Música - Trabalhos Avulsos (Edy Star, A Acompanhar o Marc Bolan Brasileiro) - Capítulo 84 - Por Luiz Domingues



Por volta de outubro de 2014, o guitarrista, Kim Kehl, formulou-me um convite. Com o impedimento de meu amigo, Marcião Gonçalves, que estaria a cumprir a mesma data com o artista folk, Renato Teixeira, surgiu a oportunidade de eu substituí-lo na banda de apoio do grande, Edy Star, para um show a ser realizado em novembro. 

A banda de apoio de Edy Star, chamava-se: "Easy Rider's Band" e mantinha como baixista titular na época, o Marcião Gonçalves, aliás, desde muito tempo. Com a presença do Kim Kehl a pilotar a guitarra, e o meu colega do Pedra, Ivan Scartezini, na bateria, o convívio e entrosamento seriam automáticos, naturalmente. 

Como se não bastasse, haveria a presença das ótimas vocalistas, Ivani Venâncio e Renata "Tata" Martinelli, ambas minhas amigas, e no caso da Tata, com um convívio bom, estabelecido no início das minhas atividades com os Kurandeiros, em 2011. Em suma, seria um prazer duplo, por acompanhar um artista histórico da MPB/Rock setentista, e também por atuar ao lado de tantos amigos com os quais estava habituado a tocar, em bandas e circunstâncias diferentes.

O Baixista & Guitarrista, Marcião Gonçalves, titular da Easy's Rider Band, de Edy Star

Claro que eu aceitei, e ainda mais para cobrir a lacuna de um velho e bom amigo, o talentoso baixista/guitarrista, Marcião Gonçalves, seria sempre um prazer poder ajudá-lo (sei que a recíproca é verdadeira), e posso contar com ele em qualquer eventualidade que eu não esteja presente.

Definido o Set List da apresentação, eu preparei muitas músicas do repertório solo do Edy, muitas do Raul Seixas, o seu parceiro mais famoso, e também alguns clássicos da Jovem Guarda e do mundo da música popularesca. Haveria também a participação de um jovem artista da cena indie, chamado: Juliano Gauche, e nós tocaríamos uma canção de seu repertório, igualmente.

Seria um show de Rock, com sabor de diversão, e um óbvio apelo Glitter, pois além do Edy Star ser um artista comprometido com tal estética de androginia setentista implícita, a apresentação seria o headliner de uma festa Gay, denominada: "Festa Odara", a ser realizada em um charmoso Centro Cultural, localizado no bairro de Pinheiros, na zona oeste de São Paulo. 

Em outras épocas, eu talvez constrangesse-me com tal característica da festa, mas em pleno 2014, acho que não havia mais nenhum tipo de margem de preocupação para tal, e como sou heterossexual bem definido e respeitoso para com as escolhas dos demais, não teria como incomodar-me em tocar em uma festa de característica "GLS", pois bastaria acionar o respeito à condição dos que professam tais preferências e em suma, eu não tinha nada contra, sem julgamentos ou incômodo com o que as outras pessoas fazem de suas respectivas vidas.

E sob a ótica do lado artístico, o aspecto interessante seria em estar a acompanhar um artista que notabilizara-se em sua carreira, pela opção pela estética Glam, portanto, o negócio seria aproveitar tocar com o Marc Bolan brasileiro, e a sentir-me a  tocar no T.Rex. 

Enfim, desprovido de preconceitos e temores tolos, fui para o ensaio com o repertório quase decorado, mas uma vez na sala de ensaio, ganhei a confiança final, pois muitas músicas foram cortadas pelo Edy, que para a minha sorte, escolheu o set list baseado nas músicas em que eu estava mais seguro. O Kim pensou em chamar outro guitarrista, ou um tecladista para encorpar o som, mas com o tempo curto, eis que mudou de ideia e perguntou-me se eu não importava-me em tocar apenas com ele a suprir a harmonia da banda. Claro que não, estou acostumado a tocar em formato Power-Trio, e se não houvesse um segundo harmonizador na banda, a vida seguiria, pois eu preencheria a linha de baixo com maior agressividade, e haveria de dar tudo certo...  

Então, ele sugeriu convidarmos um percussionista, e o nome de  Marcos Soledade "Pepito", surgiu. Nós já o tínhamos visto em ação, a acompanhar o guitarrista, Marcião Pignatari, por ocasião do show dos Kurandeiros no Ceu Jaguaré, recentemente (Festival: "Hoje tem Blues"). 

De fato, a minha impressão sobre a sua performance fora a melhor possível, pois eu ficara com o conceito de que ele era (é) um percussionista muito técnico, criativo e versátil. Feito o convite, contamos com ele no ensaio, com extremo profissionalismo, o que só fez com que aumentasse o bom conceito ao seu respeito: pontual ao máximo, com as músicas inteiramente decoradas, e preenchidas e com um swing incrível.


 

No ensaio, o clima foi amistoso e não poderia ser de outra forma. Toco com o Kim desde 2011, e com o Ivan, desde 2006. 

No dia do show, cheguei bem cedo, por temer enfrentar problemas para achar uma vaga de estacionamento, e naquela região do entorno do Centro Cultural Rio Verde, achar uma vaga, seria quase um milagre. Quando entrei, fiquei muito impressionado com as instalações. Ao apresentar uma instalação ampla, tal complexo tinha várias opções além do salão de shows. Com restaurante, lanchonete interna, várias salas onde ministravam-se aulas e estúdios que serviam como sala de ensaios para bandas, tais possibilidades impressionaram-me. 

Fora o detalhe da decoração muito caprichada, com ambientação rústica, mas muito criativa. Já no salão, parecia um teatro dos anos vinte, ricamente ornado na estética da Art-Déco, com vitrais incríveis, mezanino, escadarias, e que tais. E quando eu cheguei perto do palco, tive uma surpresa agradável: todo o aparato de instrumentos do percussionista, Pepito, já estava montado e microfonado devidamente, ou seja, ele chegara ao local, ainda mais cedo do que eu...


Fui bem recebido pelo técnico de som que disse-me ser baixista, e que capricharia na equalização do meu baixo. Maravilha, com esse entusiasmo, de fato, passamos o som do baixo por alguns minutos, e eu fiquei com a impressão de que haveria uma pressão sonora de P.A. sob um padrão de show de Rock, com força e bem equalizado. 

No palco, a monitoração ficou mesmo com peso e timbre, ou seja, o rapaz deu o seu melhor para tirarmos um som de baixo, bem interessante. Esqueci-me de seu nome, mas agradeço pelo trabalho e simpatia, muito salutar e rara, devo dizer...

Durante o soundcheck, da esquerda para a direita: Kim Kehl, Ivan Scartezini, Marcos Soledade "Pepito", e eu, Luiz Domingues

Com a chegada dos outros componentes, buscamos a equalização individual de cada um e com a banda completa, passamos várias músicas, quando ficamos satisfeitos com a monitoração alcançada.

                      Kim Kehl & Juliano Gauche no Camarim 

Como o camarim era extremamente confortável, e a conversa agradável, isso tratou de deixar a longa espera pela hora do show, bem mais amena. Claro, quando a casa abriu para a entrada do público, um DJ animou a pista com discotecagem. Aconteceu muita Disco Music, MPB e até Rock'n' Roll  para embalar o público.

Kim Kehl & Tata Martinelli em ação no show. Click de Felipe Prado

Quando chegou a hora, entramos no palco e a adrenalina estava a mil, com o público muito aquecido e melhor ainda, muito a fim de embalar-se pelo show do Edy. Nesse caso, inclusive, apesar de ter sido um público extremamente jovem, foi nítido que adoravam a figura do Edy. 

E não deu outra. Começamos com uma versão de "Satisfaction", dos Rolling Stones, e se havia alguma dúvida que a pegada seria de Rock, aos primeiros sinais do Riff, executado pelo Kim, a casa veio abaixo, com clima de show de Rock, ao estilo da velha guarda.

 Marcos Soledade "Pepito ao fundo, e eu, Luiz Domingues, na frente

Senti-me a tocar no Rainbow Theater, em 1972, com aquela ebulição toda, com o público a abarrotar o salão e a pular do começo ao fim da canção.

Edy Star, a se parecer muito com Gary Glitter, nesse click de Felipe Prado

Edy entrou em cena de forma triunfal. Um artista muito experiente, e que sabia colocar-se no palco, com maestria. 

Ao tocar, aproveitar a oportunidade para me divertir, mas ao observar tudo de uma forma arguta, percebi claramente que o Edy era um dos últimos remanescentes do "desbunde setentista da MPB". Aquela performance, rara hoje em dia, e não estou a referir-me a trejeitos homossexuais, mas a falar sobre um élan, que hoje em dia, só ele e Ney Matogrosso ainda possuem. Lembrei-me também da persona de Lenny Dale, que não foi um Rocker, propriamente dito, mas teve esse sentido do desbunde, como dançarino, e certamente que Edy era (é) da mesma linhagem artística.

Um pouco de delírio provocado naquela noite. Click de Felipe Prado

Os Rocks do Raul Seixas causaram delírio generalizado, e em "Metamorfose Ambulante", cheguei a arrepiar-me, pois causou uma comoção.

Na linha de frente das vozes, da esquerda para a direita: Tata, Ivani e Edy. Foto de Felipe Prado

Muitas canções ingênuas da Jovem Guarda, e até da Pré-Jovem Guarda (várias da Celly Campelo, por exemplo), foram cantadas aos berros pela multidão, e ao considerar-se que a maioria ali presente não era nem nascida na época do lançamento delas, tal situação motivou-me a pensar que nem tudo estava perdido, e sim, muitos jovens teriam uma percepção diferente em relação ao péssimo momento cultural que enfrentávamos em 2014, com a subcultura de massa a esmagar-nos, impiedosamente. Será que isso poderia ser atribuído ao fato da maioria ali presente ser homossexual? Nem quero entrar nesse mérito...

Juliano Gauche encarnou a figura de Sérgio Sampaio, e botou o o seu bloco na rua... foto de Felipe Prado

A intervenção do Juliano Gauche surpreendeu-me. Tanto a sua canção, o Rock: "Amor do Capeta", quanto a música do Sérgio Sampaio que interpretou, foram muito boas.

Da esquerda para a direita: Ivani Venâncio, Pepito ao fundo, eu, Luiz Domingues, e Tata Martinelli. Foto de Felipe Prado

As meninas cantaram muito. Tata e Ivani conheciam-se há muitos anos, e estavam acostumadas a cantarem juntas. De orquestras de baile a bandas de Rock como o Made in Brazil. 

Em alguns momentos, o swing da banda surpreendeu-me. Estou acostumado com o Kim e o Ivan, em bandas diferentes, mas foi ótimo tocar com ambos pela primeira vez, juntos. E o Pepito destruiu tudo, com sua percussão muitíssimo bem executada. Como diria o Wilson Simonal, Pepito foi o músico que acrescentou o Champignon para a nossa banda...

O público delirou o show inteiro, mas ao tratar-se de um contingente GLS, creio que só liguei-me que a maioria ali presente era homossexual, quando tocamos o hino Gay: "I Wil Survive", da Gloria Gaynor, onde a Tata deu um show de vocalização. De fato, tocamos sob um apelo Disco Music, mas com pegada de Rockers que éramos (somos), a música cresceu em peso, e tratou por provocar a ebulição final naquele caldeirão em que transformou-se o Centro Cultural Rio Verde.



 

 
                                   Fotos de Felipe Prado
 

Missão cumprida, encerramos o show, e com o sentimento bom de termos ido além das expectativas, mas ao gerar um onda de euforia rara, a se parecer com um show de Rock de outrora...

Claro, a vaga de baixista do Easy Rider's Band, era do amigo Marcião Gonçalves, mas se precisasse, eu iria de novo, e com a certeza de que seria, diversão pura. 

Esse show ocorreu no Centro Cultural Rio Verde, localizado em Pinheiros, na zona oeste de São Paulo, no dia 14 de novembro de 2014, com cerca de trezentas pessoas na plateia.

                                Fotos de Felipe Prado 

E como eu sempre enfatizo, o capítulo dos Trabalhos Avulsos fica em aberto e de fato, pode procurar pelo próximo capítulo, de número 85, pois logo uma nova história foi gerada!


Continua...

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