domingo, 31 de maio de 2015

Autobiografia na Música - A Chave do Sol - Capítulo 296 - Por Luiz Domingues


Mais uma entrevista a repercutir que saiu publicada, desta feita na Revista "Roll", número 25, e o entrevistado fui eu mesmo. Vou reproduzir o questionário, as minhas respostas, e posteriormente registro os devidos comentários. Claro, na transcrição abaixo, eu tratei por "modernizar" a matéria, ao substituir o antigo apelido pelo qual eu fui conhecido naquela época, pelo meu nome artístico atual...


"Técnicas

Luiz Domingues (Chave do Sol)

"Luiz Domingues, músico há nove anos e um dos fundadores da Chave do Sol, vem se destacando no cenário Rockeiro como um dos melhores baixistas surgidos nos últimos tempos. Aqui ele dá alguns dicas sobre técnica, equipamentos e influências.

Roll - Qual o seu instrumento?

Luiz Domingues - No momento uso um Fender, modelo Jazz Bass.

Roll - Há alguma modificação nele?

Luiz Domingues - Sim. Dois captadores Di Marzio, que tem maior qualidade de som e mais ataque. E troquei a ponte, também : tirei a original Fender e coloquei uma Badass.

Roll - Quais os efeitos que você usa?

Luiz Domingues - Nenhum, seja no palco ou no estúdio.

Roll - Qual o seu sistema de amplificação?

Luiz Domingues - Um Duo Vox

Roll - Você toca com os dedos ou usa palheta?

Luiz Domingues - Só os dedos, desaprendi totalmente a a usar palheta. Quando eu comecei a tocar,  preferia a palheta, mas uns dois anos depois descobri que tocando com os dedos, se tem uma qualidade de som muito melhor. Eu ganho brilho no som e mais volume.Além disso, é possível se desenvolver vários macetes. Eu, por exemplo, deixo a unha do dedo médio um pouco maior para obter timbres mais agudos. Uso também muita estilingada, o que é raro no Rock brasileiro. Isso vem da grande influência que tenho do Funk e da Soul Music, e procuro encaixar essas características no Heavy Metal.

Roll - Qual a marca das suas cordas?

Luiz Domingues - Rotosound

Roll - Quais os baixistas que o influenciaram?

Luiz Domingues - Jack Bruce, Chris Squire, John Entwistle e Geezer Butler.

Roll - Dos baixistas atualmente em atividade, qual mais o impressiona ?

Luiz Domingues - São dois : Geddy Lee e Steve Harris".



Agora, as minhas considerações sobre tal entrevista, amparadas por vinte e oito anos de distanciamento histórico (escrevi este trecho em maio de 2014)

1) De fato, eu só possuía o baixo Fender Jazz Bass, nessa época. Só fui ter o meu segundo baixo, o Tajima, modelo Precision, em 1989, nos momentos finais d'A Chave (outra banda portanto, "Sem Sol").

2) Dei uma valorizada nessa resposta, por que na verdade, quando eu adquiri esse instrumento (o Fender), ele já estava com essas modificações que eu relatei ter feito. De fato, os captadores da marca, Di Marzzio e a ponte Badass são peças com qualidade, mas hoje em dia, eu não tenho essa convicção de que sejam "melhores" que as mesmas peças originais da Fender, e ao ir além, se comprasse eu um baixo Fender, hoje em dia, não efetuaria a troca de tais peças, para deixá-lo original.

3) Isso não mudou... continuo avesso aos efeitos, pedais e que tais e olhe que vinte e oito anos depois, o mundo tecnológico de hoje em dia (2014), inunda o mercado com novidades sob um ritmo frenético, e nada me apetece. Continuo a gostar do som puro do instrumento e tenho dito...

4) Aqui nessa resposta, foi uma mentira estratégica e por motivo de vergonha. Sei que não justifica-se, é claro, mas na época em que concedi tal entrevista, fiquei envergonhado em expor a minha situação pessoal e vexatória por não possuir um amplificador na ocasião. De fato, quando a minha banda cover do período 1979-1982 (Terra no Asfalto), encerrou as suas atividades, eu poderia ter optado por ficar com o amplificador que usava, quando da divisão do espólio da banda. Mas optei por ficar com o mini P.A., a mesa de som e uma câmara de eco. Graças a esse sacrifício pessoal, A Chave do Sol nasceu com uma pequena estrutura de apoio para ensaiar, e esse mini P.A. não apenas sustentou os nossos ensaios por mais de quatro anos, como também deu suporte em vários shows sob pequeno porte que fizemos ao longo da carreira. 

Todavia, o preço que eu paguei por isso foi alto, pois só consegui comprar um amplificador em 1987, nos momentos finais d'A Chave do Sol. Explicado isso, quando o jornalista formulou tal pergunta, é claro que não poderia citar essa longa história para justificar a minha situação em não possuir um amplificador, simples que fosse. E ao mesmo tempo, foi ridículo àquela altura dos acontecimentos, expor tal situação, pois denotava uma contradição à própria fama que eu havia construído nos últimos anos... portanto, foi uma questão embaraçosa que obrigou-me a contar uma mentira com uma segunda intenção implícita. Claro que arrependo-me, mesmo assim, e hoje em dia, responderia com sinceridade, que não tinha e ponto final... qual o demérito?

E por ironia do destino, em 1990, eu compraria um segundo amplificador, e que foi um Duovox... parece que foi profético!

5) Impressionante como mudamos gradativamente de opinião e de uma forma radical com o passar do tempo! Na época, defendi com unhas e dentes a técnica do Pizzicato (uso dos dedos, da mão direita), como "superior", ao alavancar diversas vantagens que eu achava válidas na ocasião. Hoje, penso exatamente o contrário!


Com palheta, o baixista tem muito mais precisão, timbre, brilho, ou seja, o dedo, sob a técnica do pizzicato, funciona em estilos musicais mais calcados em linhas tradicionais do contrabaixo, ainda pensado como uma extensão do baixo acústico, ao tentar simular-se as situações e timbres característicos do baixo acústico.  Desde 1992, eu voltei para a palheta com toda a convicção, e passados vinte e dois anos (escrito em 2014), não tenho dúvida de que é muito melhor para os meus propósitos, e basta ouvir os discos que gravei depois desse advento, e comparar o timbre. 

Em minha opinião, não há discussão a pensar-se em meu modo de enxergar a música. Foi engraçado eu ter usado a palavra "estilingada" para designar a técnica do "Slap". De fato, eu incorporava tal recurso à época, mas de uma forma comedida. E de fato também, causava uma certa estranheza entre os adeptos do Rock pesado oitentista, notadamente o pessoal do Heavy-Metal. No entanto, era algo normal para mim, pois conforme eu disse na entrevista, sempre gostei de Black Music, em suas várias vertentes. Contudo, pus-me a abandonar o "slap", e posso afirmar que há anos nem cogito usar tal recurso. Acho-o muito enfadonho hoje em dia, e se for para buscar o swing do Soul/Funk/R'n'B, uso outros recursos bem mais agradáveis em minha percepção. 

E por fim, foi lamentável eu ter falado em Heavy-Metal. Acho que fui infeliz nessa colocação pois já tínhamos virado essa página em 1986, e pelo contrário, tentávamos a todo custo retirar os resquícios desse erro estratégico de 1985, e então, inadequadamente, eu vou dar uma entrevista para uma revista de circulação nacional, e falo uma bobagem dessas... pois eu mereci ter recebido um cartão amarelo por tal deslize!

6) Citei quatro baixistas sensacionais que realmente admiro (nada contra o Geezer Butler, mas deveria ter escolhido o John Paul Jones, que influenciou-me muito mais, além do Gary Thain), mas na verdade, poderia falar de outros vinte pelo menos, que tem o mesmo peso de influência para mim. Nessa pergunta em específico, aconteceu algo insólito, pois o repórter desligou o gravador e deu-me uma "dica" : tudo bem eu gostar desses baixistas "do passado", mas isso poderia desapontar os leitores/fãs. Pediu-me então que citasse ao menos um que fosse moderno, para que houvesse uma identificação maior com os leitores. Não era uma exigência, mas uma sugestão de amigo, visto que quem me entrevistava era o Tony Monteiro, um jornalista que era admirador confesso da Chave do Sol e queria muito nos ver numa situação de carreira, melhor. Portanto, foi quase uma dica de um assessor de imprensa.

Então, só veio uma ideia na minha mente: Geddy Lee, o baixista do Rush. Não era exatamente um baixista moderno nos anos oitenta, mas a despeito de ser uma figura que veio dos anos setenta, estava a atravessar a década de oitenta com muita dignidade e respeito da nova geração de adeptos do Rock pesado, com trânsito livre inclusive, entre os amantes do Heavy-Metal e Hard-Rock oitentista.

Mas mesmo assim, foi uma mentira educada de minha parte, pois mesmo a reconhecer que ele é excelente e o Rush, uma banda muito boa, eu nunca fui um admirador contumaz dele, tampouco desse grupo. Ao ir além, até acho bons os primeiros discos desse conjunto, mas nunca emocionou-me ao ponto de eu ser um fã potencialmente a falar, e nunca interessei-me em absorver alguma técnica dele, Geddy Lee, como músico.

Entretanto, pior ainda, foi quando o Tony sugeriu que eu incluísse mais um. A sua intenção foi ótima e eu lembro-me dele a falar textualmente: coloque mais um nome moderno, por que esses que você citou, são desconhecidos para essa molecada nova"... e ao avançar em sua observação, "soprou-me": Steve Harris.

Não vou dizer que o acho ruim. Pelo contrário, dentro do seu estilo, ele é bom, competente, honesto e merece mais uma série de adjetivos. Contudo, eu nunca gostei do Iron Maiden, pois como sempre digo, não aprecio o gênero Heavy-Metal, e quando vi/ouvi o Iron Maiden pela primeira vez, em 1981 aproximadamente, eu já era um Rocker de forte convicção afeito por um bilhão de outras influências que reputo mais importantes, e não houve motivo para encantar-me com aquela estética, aliás, pelo contrário...

Porém, ao perceber que uma resposta diplomática poderia ser mais conveniente para carreira d'A Chave do Sol, e minha por extensão, aceitei a dica e o disse. Entretanto, pela resposta que emiti, está nas entrelinhas que o respeito, mas claro que não influenciara-me em nada.  Hoje em dia, eu não acataria a sugestão e responderia 100 % o que penso. Mas isento em 1000% o Tony nessa questão, pois a sua intenção em ajudar-me foi nobre, sem nenhuma dúvida.

Agora sim, vou falar sobre os tais fatos animadores em fatores extra-shows que aconteceram nesse período entre abril e junho de 1986.

Continua...

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