quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Autobiografia na Música - Patrulha do Espaço - Capítulo 170 - Por Luiz Domingues

O  dia do show começou um tanto quanto tenso, pois o nosso então sócio-motorista não sabotara a nossa volta para São Paulo como comentara que o faria com o seu amigo carrier, em meio a uma conversa interceptada pelo Samuel Wagner, mas estava bem mal-humorado. A sua relação conosco estava bastante desgastada, e caminhava para o seu final. Mas falo sobre isso mais tarde.

Mesmo sob um clima deveras estranho, ele nos auxiliou com a sua van, pois como não precisávamos utilizar o nosso backline inteiro, não houve a necessidade premente de usarmos o ônibus.
Claro, aconteceu uma compensação financeira e justa, mas até poucos momentos antes de concretizar a sua vinda, tivemos o plano "B" de irmos com o equipamento alojado em nossos carros particulares como uma possibilidade quase certa. Enfim, fomos com os nossos automóveis, de qualquer forma, por que a van dele era exclusiva para carga, sem bancos para passageiros.

Chegamos ao Sesc Pompeia no horário combinado para o soundcheck. O show aconteceria nas dependências da sua famosa Chopperia, onde dois meses antes, realizamos aquele show acústico 100%, à luz de velas, que eu já comentei anteriormente.
Desta feita, contudo, seria completamente diferente, com um show elétrico e portanto, muito mais confortável para nós. O soundcheck foi bastante tranquilo e as duas bandas e os seus respectivos convidados, estavam bastante relaxados e satisfeitos com o som no palco. Rumores deram conta de que um público significativo formado por fãs do Sepultura estariam presentes para ver o Andreas em ação. 

Para nós, foi ótimo que o prestígio pessoal dele tivesse esse poder de chamariz adicional para o evento. Todavia, claro que o público típico do Sepultura não pagaria para ver a Patrulha do Esapço, muito menos o Tutti-Frutti, em circunstâncias normais.
Quando subimos ao palco, a casa não estava lotada, mas houve um bom contingente presente. Aos poucos, em meio ao nosso show, eu notei que chegavam mais pessoas e de fato, isso foi uma tendência.
Não foi o nosso show tradicional e completo, mas não posso afirmar que tenha sido um show de choque. Digamos que foi um meio termo entre os dois, mediante um show "quase" normal, levemente reduzido, apenas.
Quando o Andreas foi chamado ao palco, aconteceu uma reação forte de seus fãs. De fato, haviam muitos deles no público. A sua performance foi marcada pela energia, porém a respeitar inteiramente a nossa pegada infinitamente mais leve que a da sua banda.

O Marcello foi tocar teclados, ao deixar o Rodrigo como guitarrista da banda e neste caso a poder interagir com o Andreas na outra guitarra. E de fato, houveram momentos muito inspirados de troca de solos entre ambos, ao improvisarem livremente no arranjo adaptado das músicas: "Olho Animal" e "Robot".
Nas duas fotos acima, com a participação de Andreas Kisser conosco no Sesc Pompeia, não tenho certeza, mas desconfio serem da autoria da fotógrafa, Ana Fuccia

Claro que ambas as canções continham o ranço Heavy-Metal que tanto lutamos para extrair da Patrulha do Espaço em nossa fase, mas os acontecimentos que surgiram nos últimos meses, quase que nos impeliu para elas, infelizmente.  
Mais uma foto desse show: "Sãopaulistas", com a presença de Andreas Kisser como nosso convidado. Esta em específico, desconheço o crédito do fotógrafo. Só sei que achei-a na Internet, e que pertence ao acervo de Ray Castello, filho do Junior

"Robot" até que era palatável e detinha um mote na temática da letra, interessante, mas "Olho Animal" mostrava-se difícil para nós, Marcello, Rodrigo e eu, que a considerávamos fraca, harmônica e melodicamente, e o pior de tudo, com uma letra infantil e bastante cafona.

Mas não teve jeito... dali em diante, ambas voltaram ao set list de shows, sob a alegação de que principalmente fora de São Paulo, eram canções solicitadas pelo público que mais reconhecia a Patrulha do Espaço por esses trabalhos oitentistas, do que com Arnaldo Baptista e/ou da fase áurea do trio clássico: Junior, Serginho e Dudu.

Passada a participação de Andreas, que causou muita comoção entre os fãs do Sepultura, encerramos o show com mais duas ou três músicas, e sem a presença dele doravante no palco.
Saímos de cena bastante aplaudidos e entregamos ao Tutti-Frutti, um público já bem aquecido e ansioso por mais Rock. Lembro-me de assistir grande parte do show deles pela coxia. Foi bastante energético, com a banda a tocar os seus maiores sucessos, da época em que contavam com Rita Lee em suas fileiras.

Para encerrar, fomos chamados novamente ao palco para o número final. Neste caso, foram dois backlines ligados ao mesmo tempo, pois cada banda ficou "setada" ao mesmo tempo, a usar apenas a metade do palco. Isso foi bastante prático sob o ponto de vista do áudio, e o set up arrumado para cada um, mas cenicamente a falar, foi muito estranho, pois cada banda tocou como se estivesse em numa gangorra, "espremida" em um canto...

Já no ensaio no estúdio do Luiz De Boni, sabíamos que seria uma temeridade tocarmos com duas baterias, dois baixos, quatro guitarristas, um trombonista, e dois tecladistas. Por mais parcimônia que se faça, é claro que um desarranjo seria produzido. Combinamos então em estabelecermos uma dinâmica máxima, e no contato visual, combinar o revezamento de solos entre os guitarristas, tecladistas e o trombonista , Bocato. 
Nas duas "cozinhas", o combinado foi o mesmo, ou seja, os dois bateristas acertaram o revezamento nas viradas e assim, eu, Luiz e o saudoso baixista do Tutti-Frutti, Ruffino Lomba, também combinamos de um ficar na região aguda e o outro no grave, e assim evitarmos frases complexas e mudanças na divisão rítmica que derrubassem os demais companheiros.

Começamos a tocar a canção dos Beatles, e no início parecia estar dando tudo certo, com todo esse cuidado sendo observado. Mas claro que na adrenalina do show e com o público a responder bem, o trem da prudência descarrilou... e quando encerramos, estava muito alto e com vários músicos a exagerar em suas respectivas performances pessoais.

Todavia, claro que aconteceram momentos bons, com bastante emoção nos solos inspirados, e no peso que a música ganhou, com duas bandas e mais três convidados. Lembro-me do trombonista, Bocato, estar bem ao meu lado e ter feito um solo de trombone que arrancou suspiros do público e de nós também. Me senti a tocar no "Mothers of Invention" do Frank Zappa, em seus melhores momentos!

Foi um ótimo show, não apenas de nossa parte, e do Tutti Frutti, mas como espetáculo inteiro para o público. Mesmo assim, ainda sustento a minha opinião de que o Sesc deveria rever essa mentalidade de fazer sua programação só baseada em "projetos", pois isso diminui os artistas, ainda que eu deduza que tal perspectiva nem passe na imaginação dos programadores.

Na saída, eu estava perto da van, a supervisionar o seu carregamento, quando uma discussão muito ríspida entre o nosso roadie, Samuel Wagner e o motorista, irrompeu. O clima esquentou e por um triz, eles não foram às vias de fato. Seguranças do Sesc agiram rápido e os apartaram. O clima entre ambos estava azedado há algum tempo, e isso a ocorrer nesse instante só piorou a relação já estremecida.
De fato, não havia mais clima para manter essa parceria, e logo teríamos que tomar uma atitude, pois novos shows fora de São Paulo estavam marcados, e a turnê não podia parar.

O nosso próximo compromisso nesse sentido seria cumprido apenas ao final de fevereiro, contudo, antes disso, além de enfrentar esse problema para dissolver a parceria com o motorista, e ficar ou não com o ônibus em nossa posse, uma oportunidade fortuita nos foi oferecida e estes dois shows em questão, renderam muitas histórias.

O show do Sesc Pompeia ocorreu no dia 25 de janeiro de 2002, aniversário de São Paulo, com cerca de trezentas pessoas presentes.  
Continua...

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