A unidade do Sesc Pinheiros nessa época, era bem tímida em sua constituição física. A instituição estava a construir ainda a sede gigantesca dessa unidade, que hoje em dia é muito bonita e promove dúzias de atividades educacionais, artísticas e culturais, mas nessa ocasião de nosso show, usava um sobradão residencial adaptado de forma improvisada. Ao ficar situada em plena Avenida Rebouças, claro que era uma tremenda casa, nos moldes dos casarões residenciais que se tornaram comerciais dos anos setenta em diante, mas por outro lado, bem modesta em comparação ás instalações que ostentam hoje em dia naquele mesmo bairro.
Bem, a despeito disso, fomos com toda a boa vontade para fazermos o melhor possível, dentro da perspectiva que nos apresentavam, ou seja, não havia um auditório adequado com infraestrutura para shows musicais, mas sim um espaço adaptado, onde outrora deve ter sido uma ampla sala de estar residencial.
Claro, mesmo assim, era o Sesc e toda a estrutura mínima de eletricidade, assim como um equipamento terceirizado de PA e iluminação que estavam a postos. Foi tudo centrado no conceito minimalista, claro, calculado nos parâmetros da engenharia acústica para o local.
Fomos bem recebidos pelos funcionários do Sesc e pelos técnicos terceirizados, mas mesmo assim, nós tivemos um princípio de aborrecimento, quando os primeiros trabalhos de ajustes de som começaram.
Assim que o Rolando Castello Junior montou a sua bateria e fez uma checagem básica, a tocar (isso é praxe de todo o baterista, tocar um pouco a simular situações de show para acertar os ajustes das peças), duas senhoras que trabalhavam em um gabinete anexo, como escriturarias, apareceram exaltadas no salão, a clamar que o "barulho" que ouviram era inadmissível e que estavam a trabalhar.
Ora, aquilo fora apenas o início do trabalho de soundcheck e a bateria ainda nem havia sido microfonada devidamente. Se o seu som natural soara demais para elas, imagine então quando o técnico iniciasse o ritual de captura de cada peça, e os testes de equalização geral começassem efetivamente.
Com tal manifestação, de início já estava caracterizado que aquela unidade em específico não estava acostumada a realizar shows. No máximo deviam acontecer ali apresentações intimistas na base da voz & violão, em termos musicais e o espaço, naturalmente, devia ser mais usado para palestras, saraus literários ou atividades infantis com contadores de histórias para os pequenos etc.
Portanto, aquela situação foi um tanto quanto surreal, pois o usual ali deveria ser o silêncio a se caracterizar quase como um ambiente de trabalho de um escritório tradicional e fora do horário comercial, é que as atividades culturais deviam acontecer. E como não se costumava abrigar apresentações que necessitassem de um PA, por mínimo que fosse, não estavam habituados a conviver com tardes de soundcheck, uma atividade profissional natural em qualquer casa de espetáculos/teatros.
Até aí tudo bem, a Sarah Reichdan intercedeu com explicações, e as pessoas em questão não eram brucutus ignorantes que não tinham discernimento para enfrentar conflitos. De comum acordo, combinou-se então que o trabalho mais pesado de soundcheck ficasse para depois das 18 horas, quando o expediente burocrático da unidade se encerrava, e nós concordamos em cooperar, mesmo sendo desconfortável para nós deixarmos essa atividade para mais tarde, e assim extrair minutos preciosos de nossos momentos pré-show, quando seria importante estarmos relaxados para fazer um bom espetáculo.
Enfim, diante de outros problemas que enfrentamos em circunstâncias muito mais adversas em outras apresentações em outros lugares, isso não foi nada.
O som ficou bem equalizado e claro, foi patente a necessidade de fazermos uma dinâmica "espartana", pois qualquer acento mais forte do baixo e bateria, causaria um verdadeiro tsunami sonoro sobre os violões, flauta e vozes. O jeito foi tocar de forma muito comedida, a entrar no âmbito dos violões e vozes como parâmetro, e assim se evitar os tradicionais voos que a cozinha dessa nave fazia nas apresentações elétricas corriqueiras. E assim foi no show.
Um bom público compareceu (para os padrões daquele tímido salão, é bom ressalvar), e quem apareceu, viu um show diferente, não só por essa docilidade sonora não usual para a nossa banda, mas principalmente pelo set list com muitas surpresas que fãs mais ardorosos e conhecedores da nossa história, certamente regozijaram-se em receber.
De volta ao que venho a comentar nos últimos capítulos, louvo muito a atuação da produtora, Sarah Reichdan, que nesse período, muito nos ajudou, principalmente ao produzir shows nossos em várias unidades do Sesc, que era (é), um dos melhores, senão o melhor circuito de shows deste país.
Todavia, este foi mais um show não exatamente confortável, ao fugir das nossas melhores características. Fazer show acústicos ou semi-acústicos, ou a ter que abrigar convidados, não foi de todo mau, mas o que ambicionávamos mesmo, seria engatar uma série de shows nas unidades do Sesc, sob condições normais, ou seja, um show de Rock com eletricidade e volúpia, que sempre foi o nosso real modo de ser.
Mas isso nunca ocorreu, lamentavelmente, da parte dela, Sarah.
Isso por que em breve faríamos um show na unidade do Sesc Ipiranga, no bairro homônimo da zona sudeste de São Paulo, onde fizemos um show de Rock ao nosso estilo e predileção, mas o produtor desse show foi o Paulo Barnabé, baterista e irmão do compositor & pianista, Arrigo Barnabé.
Enfim, treze anos depois (a escrever este trecho em 2015), agradeço muito à Sarah, sem dúvida alguma, embora as suas produções nunca tenham caminhado conosco em igualdade de sintonia, nesse aspecto dela enxergar apenas saídas alternativas para semear algo para um futuro que nunca chegou, na prática.
No dia seguinte ao nosso show no Sesc Pinheiros, tínhamos um compromisso no interior de São Paulo. Foi uma volta à casa noturna "My Way", da cidade de Americana-SP. Eu falei sobre a nossa primeira passagem por essa cidade e casa em específico, com detalhes em capítulos anteriores. Não vou cansar o leitor com uma eventual repetição nesses termos.
O que posso acrescentar, é que desta feita, tal show não serviria de apoio estratégico para uma fade da turnê interiorana, como houvera ocorrido em dezembro de 2001, mas tratava-se de uma oportunidade sazonal. Claro, naquela casa noturna, o dividendo artístico a ser conquistado era nulo. Sendo muito claro, ali só valia a pena tocar pelo cachê. E o único consolo extra-monetário nessa determinação, foi o de que mesmo em condições infrutíferas, sempre apareciam fãs reais da banda. Foram poucos, mas certamente que a emoção deles em estar ali, nos contagiou e estimulou muito.
E para encerrar o mês de abril de 2002, nos apresentamos mais uma vez na casa noturna: "Volkana", em São Bernardo do Campo-SP, no ABC Paulista.
Desta feita, duas bandas de abertura estiveram presentes: "O Vale das Borboletas" e o "General Pig". Não tenho grandes lembranças dessas bandas, a não ser que "O Vale das Borboletas" era bem mais leve e com esse nome, bem interessado em sonoridades 1960 & 1970, e que o "General Pig" era mais híbrido e pesado, sem grande comprometimento retrô, e pelo contrário, a soar "modernoso".
Sobre as datas e público presente em cada show:
Sesc Pinheiros - São Paulo/SP - 2 de abril de 2002 - cinquenta pessoas
My Way - Americana/SP - 3 de abril de 2002 - duzentas pessoas
Volkana - São Bernardo do Campo/SP - 26 de abril de 2002 - cem pessoas
Uma aventura e tanto aconteceu logo no início de maio, e que gerou uma história bizarra, e que de certa forma, foi triste para a banda.
Mas antes, abrirei parênteses para falar sobre a inclusão digital que a banda adquiriu, graças aos esforços solidários e espontâneos de um adolescente que nos abordara ainda em 2001...
Continua...
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